Assonia, ou a medida da harmonia

02/05/2018 - Publicado por: Sensei Marcos Tavares

Assonia, foi ela quem me ensinou a lição mais completa que aprendi no aikidô. Assonia é um substantivo feminino, uma palavra daquelas que a gente não sabe que existe, que poderia muito bem passar uma vida inteira sem sentir o efeito de sabê-la. De fato, passamos por essa existência realizando muito pouco de nossas potencialidades. O Drummond escreveu aqueles versos primordiais: “Tarde, a vida me ensina esta lição discreta: a ode cristalina é a que se faz sem poeta”. A sensação é que tardamos a enxergar o essencial e, quando enfim captamos a mensagem, o aprendiz que somos não está mais ali, pois, a simples compreensão de um estado nos coloca em outro patamar, diante de nova mensagem.

A essência do aikidô é a harmonia com benevolência: perceber, absorver e redirecionar energia. Sem confronto, sem impacto, sem violência. O que importa é o fluxo da força, a continuidade do deslocamento e não o corpo que se desloca. Amor, compreensão, conexão, essas são palavras aparentemente estranhas a uma arte marcial, mas que estão na base do aikidô. Mais que exercício físico é uma prática filosófica. Aprecio particularmente quando se traduz a palavra aikidô como sendo o “o caminho da unificação”, é de uma profundidade teosófica abissal, pois contêm o princípio basilar de que devemos combater o egoísmo e buscar a unificação. A harmonia se consolida à medida que neutralizamos a separatividade.

Amor é a mais óbvia e a menos entendida das palavras. O amor não tem objeto, é sempre um caminho, mas só o vemos em parte, naquilo que se reflete: a pessoa, a roupa, o carro, o lugar, a bebida, a comida, a casa que amamos. Amamos a sensação, o prazer, a segurança, a beleza, o efeito que isso reflete em nós. Agora, imagine que o amor seja a luz do Sol que se propaga pelo Universo em todas as direções, tudo que você distingue à sua volta está tocado por essa claridade. Isso faz com que percebamos as diferentes formas e podemos dizer que amamos aquelas percepções que nós atraem mais. Ou seja, uma pequena porção tocada pela luz. Mas se pudéssemos enxergar o todo – as religiões prometem essa visão face a face – perceberíamos que o amor é a luz e não o objeto iluminado, e que esse amor se manifesta indistintamente em todas as coisas. Nesse dia, amaríamos até os inimigos, pois estaríamos acordados enquanto eles ainda dormem.



Autor: Joel Gehlen